O Brasil sentiu
muita tristeza nesses últimos dias, por conta do trágico assassinato de uma
criança de 11 anos: o pequeno Bernardo. Investigações em andamento, há o
envolvimento confirmado de uma enfermeira, de uma assistente social e do
possível coautor: o médico, pai da criança.
Disse um ganhador
do premio Nobel da Medicina do ano de 1.947: “O médico é mais perigoso que uma fera, porque dela as pessoas se
afastam, pelo perigo, enquanto que ao médico se entregam na maior confiança,
sem saber que as escolas médicas não são capazes de separar o bom do mau
médico.”
O Nobel de
Medicina que disse isso foi o argentino Prof. Bernardo Houssay, de Neurofisiologia,
da Faculdade de Medicina de Buenos Aires. Isso vi publicado numa edição antiga
do Jornal do Conselho Federal de Medicina, que tem por missão exatamente
controlar o comportamento ético profissional dos médicos brasileiros.
É uma triste realidade,
constatada em 1.947, e que fatalmente tende a piorar com o evoluir dos tempos,
com base na qualidade de ensino médico hoje altamente discutido. Veja a
constatação do CREMESP que testou o nível de formação em prova recente,
resultando em 56 % de despreparados para o exercício profissional, ao final dos
6 anos de curso.
Felizmente, os casos
de monstruosidade que mais chocaram a sociedade brasileira, envolvem
proporcionalmente poucos indivíduos travestidos de médicos. Alguns exemplos: um
“esquartejador” da namorada, a mãe médica que matou filho e futura nora, o
recente pai suspeito de matar o filho, passando a ter reaberto o processo que
concluiu pelo “suicídio” da ex exposa e
mãe dessa criança.
Por mais que haja, são poucos. Mas são
médicos. Isso choca ainda mais a sociedade por serem figuras das quais se
espera atitudes advindas de sagrada deposição de muita confiança.
É difícil, até
ousado, tratar desse assunto, sendo um médico cirurgião que sempre pautou sua
meta na luta para conseguir o máximo de bons resultados possíveis. São 41 anos
de carreira em que sempre busquei defender a classe, com base na atuação dos
bons, dos vocacionados, dos bem formados e dos injustiçados pela incompreensão
malévola.
Pautei me a
estudar o Direito, pensando em defender o tipo padrão de profissional, como uma
das futuras missões, no enorme leque de atuação do advogado no chamado Direito
de Saúde, que certamente será um ramo definido da advocacia. Bem claro:
defender o bom, o vocacionado e, eventualmente, o injustiçado médico.
Em suma, se uma
“generosa” maioria são bons profissionais, uma incômoda parcela da minoria, mesmo sem
serem rotuláveis de monstros, preocupa os gestores, dirigentes e controladores do
bom exercício da Medicina. Que se dirá dos tais “médicos monstros” ?
O que me passa
pela cabeça, e certamente da maioria, bem enquadrada na nobre missão, é ver a
justiça ser feita no âmbito criminal, mas com a suspensão imediata e perda do
direito de exercer uma profissão na qual ainda muito se acredita.
Dia desses, um
mestre de Direito, da cadeira de ética profissional, dizia num curso em rede
nacional: às vezes sinto vergonha de ser advogado, quando deparo com notícias nacionais
envolvendo advogados em situações criminosas ou de corrupção, que me fazem
perguntar: será que não teria sido melhor ter feito Medicina, ao invés do Direito
?
Acho que nesses
dias, a reflexão sobre esse arrependimento, do ilustre Mestre deve ter sido
minorado pela mácula de um pai médico e, possivelmente, homicida do próprio
filho.
Assunto árido, eu
sei. Extremamente triste. Chocante pela vida ceifada e pela circunstância do
ocorrido. Mas uma verdade que nos leva a uma forte reflexão e que não pode ser
escondida.
Ora me vem o
dever do alerta, sem alarme ou alarde, de que tais tipos podem estar permeando
o nosso meio. Talvez nem tanto monstros, porém, há figuras capazes de posturas
indignas da profissão, quando procuram se investir na direção de aproveitar-se
da confiança dedicada ao rótulo, sem se aperceber a verdadeira atitude.
Que se desconte
aqui a visão jurídica que possa estar nesse momento me influenciando. A
análise, pode acreditar, vem puramente
da formação médica e da experiência acumulada ao longa da vida, levando-me à indignação, como também a muita gente.
Fica o triste registro.
Dr.
Fauze José Daher
Gastrocirurgião, Diretor Clínico da Santa Casa de Barretos
Acadêmico de Direito do UNIFEB